Dezenas de milhares de pessoas se reuniram na tarde deste domingo (5) em Copenhague, capital da Dinamarca, para protestar contra um projeto de lei do governo que pretende aumentar a arrecadação e incrementar os gastos de defesa. Pelo texto, o meio para garantir isso seria abolir um dos feriados do país, garantindo as receitas com impostos e a atividade econômica de um dia útil.
O ato foi convocado pela maior central sindical dinamarquesa, que estimou o público presente em 50 mil pessoas —a cidade tem 600 mil habitantes. Segundo a agência de notícias Reuters, isso faria da manifestação a maior do país em mais de uma década. A polícia e o governo, por sua vez, não fizeram um cálculo do tipo.
A primeira-ministra Mette Frederiksen apresentou o projeto em dezembro para eliminar o feriado luterano chamado de “Store Bededag” ou Grande Dia de Oração. A data, que cai na quarta sexta-feira depois da Páscoa (neste ano, em 5 de maio), é celebrada desde 1686.
Além dos sindicatos, a oposição, os bispos e até membros dos partidos que compõem a coalizão do governo criticaram a ideia, que foi debatida pela primeira vez no Congresso nesta semana —há mais duas rodadas de discussões, em datas a definir. A Dinamarca possui hoje 11 feriados nacionais, o mesmo número do Brasil.
Por trás da proposta de Frederiksen está um aumento da arrecadação federal que permita incrementar os gastos de defesa em meio à Guerra da Ucrânia. Na Conferência de Riga de 2006, a Otan, a aliança militar ocidental, estabeleceu que países-membros deveriam reservar 2% de seu PIB para gastos militares, mas esse patamar raramente é atingido e nunca foi seguido por todos os 30 membros do grupo.
Frederiksen quer antecipar em três anos, para 2030, a meta de atingir os 2% do PIB, e é nesse contexto que entra a proposta de acabar com o Grande Dia de Oração. No ano passado, o orçamento de defesa do país foi de cerca € 3,5 bilhões, 1% do PIB.
Pelos cálculos oficiais, o cancelamento do feriado, colocando indústria, comércio e serviços em atividade, geraria até € 400 milhões (R$ 2,2 bilhões) a mais para o governo —uma ajuda, mas nem de longe o suficiente, para que o gasto militar chegue aos € 7 bilhões que a Otan gostaria.
A primeira-ministra defende também, depois de ter passado por uma crise política, reformas abrangentes para lidar com o modelo de bem-estar social do país. Frederiksen promete levar em frente a ideia mesmo ante oposição geral, usando a frágil maioria de sua coalizão no Parlamento para fazer avançar o projeto.
“Normalmente essas medidas são discutidas com a classe trabalhadora, mas agora esse modelo está prestes a ser atropelado. Estamos protestando para que, com sorte, nos façamos ouvir”, disse à Reuters o encanador Stig De Blanck, 63, no ato em frente ao Parlamento em Copenhague.
À AFP Lizette Risgaard, líder da FH, uma das entidades que organizaram a manifestação, que conta com 1,3 milhão de filiados no país, classificou a proposta de totalmente injusta. “Na próxima vez que o Parlamento disser que é necessário mais dinheiro eles vão eliminar outro feriado ou algum domingo?”, disse.
“Não acredito que o dinheiro para a guerra sirva para fazer a paz”, afirmou Kurt Frederiksen, chefe do ramo de hotéis e restaurantes, filiado à central sindical 3F.
Economistas questionam o impacto a médio e longo prazo do fim do feriado na arrecadação, afirmando que sindicatos e trabalhadores encontrariam maneiras de ajustar a carga horária de qualquer forma. Segundo dados da OCDE, os dinamarqueses trabalham uma média de horas menor na comparação com outros europeus.
Fuente FOLHA DE S.PAULO